terça-feira, junho 8

Buraco negro


De repente me vi perdendo o jeito de poetizar.
As palavras não mais me vinham como antes,haviam rompido a relação afetuosa e íntima que mantinham com meus pensamentos.
Já não sabia mais falar de amor, não sabia mais transformar o real em abstrato e torná-lo interessante.A cumplicidade que sempre me foi dada gratuitamente pelas palavras tão perspicazes e constantes nessa eternidade a que pertencem , foi-me arrancada estupidamente,senti como se apertassem meu coração violentamente ,ele sangrava e pedia um abafado socorro.
Minhas mãos trêmulas e meus olhos entediados buscavam rasurar no caderno de um vermelho delicado algumas palavras,alguns versos,alguma coisa que me fizesse reviver.
Era como se  a sede de inventar que antes  me envolvia de forma plena e inquestionável, houvesse morrido em mim e permanecesse padecendo em mim. 
Eu tentava concentrar-me , distraindo-me no vago da imensidão que me rodeava interiormente.
Transportava-me para tantos outros horizontes,afim de encontrar inspirações capazes de livrar-me da beira do precipício em que me encontrava naquele instante.
Meu corpo gelado e meus lábios empalidecidos denotavam a razão da minha angústia.
Foi quando senti-me sendo impulsionado naquele buraco negro e profundo,meu coração palpitava instintivamente , meus olhos trepidavam e lágrimas cristalinas  fugiam de mim.
Eu sabia que era o fim.
Algumas cenas começaram a perturbar minha mente,vinham embaralhadas como um jogo de cartas,eu ouvia vozes ao longe,gritos ensurdecedores,gargalhadas medonhas e murmurações tristes.
De repente,um barulho se fez e tudo escureceu,não havia mais imensidão,não haviam mais lágrimas,não existiam poesias,não mais vivia eu...

... Violentamente meu corpo se levantou,meus olhos se arregalaram,eu suava frio e mantinha uma respiração ofegante,minhas mãos estavam cerradas fortemente  e meu coração mais uma vez palpitava continuamente.
Passou-se um filme em minha mente,comecei a ver tudo  o que havia acontecido a poucos instantes.
Eu não estava compreendo muito bem,até que percebi que havia sonhado, no momento chamei o meu  sonho de pesadelo terrível.
Acendi a luminária que estava sobre o criado mudo perto da cama e, peguei o copo d'água que estava ao lado.
Buscava minha plena lucidez e tentava entender o que havia levado-me a sonhar aquilo.O relógio que fazia ininterruptamente o seu "tic-tac" discreto, marcava três horas da manhã.
Permaneci estática e inerte por alguns minutos,até que as minhas pálpebras começaram a pesar em uma tentativa constante de fecharem-se,meu corpo pesava e, eu fui deitando-me novamente,quando veio-me alguns versos que eu jamais ouvira, arrastados delicadamente por uma brisa leve e um aroma de rosas perfumadas e arrebatadoras...

O viver que trago é mim é feito de palavras e versos
É como menino que precisa de afago e suplica por atenção
O meu viver  que é feito de estrofes precisa que eu rabisque 
que eu transforme meus versos soltos
 no concreto mais abstrato que possa existir.

O meu viver é pura poesia...
O meu ser vive do poetizar...
O meu silêncio me transmutou  
e tornou-me mistério indecifrável 
Fez-me curiosa e perspicaz
Ou se preferir, simplesmente poetisa!

3 comentários:

  1. Ai amiga...muito bem construído o seu texto, ou especificamente falando, o seu conto (eu acho...rsrs). Interessante, a história que você criou para falar da arte de escrever e também de algumas dificuldades que sofremos quando queremos criar. E o final inusitado, muito bom também. Parabéns!

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  2. Anônimo7/16/2010

    Achei surpreendenteeee!
    o modo como usou as palavras, que se entrelaçaram com o seus mais sombrios pensamentos! tudo teve uma ligaçao cuja qual nao dá para explicar apenas simplismente Incrivel o seu jeito de se expressar!

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  3. Obrigada May!
    Obrigada anônimo!

    :)

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